No meio da aula, o aluno desvia o olhar do quadro depois de
ouvir um bipe de dentro da mochila. Na sala ao lado, frente aos computadores,
um grupo de meninas tenta acessar a página virtual de sua banda preferida, sem
sucesso. As cenas são corriqueiras nas escolas brasileiras: desde que as redes
sociais revolucionaram a navegação na internet, ficou difícil para professores
e pais se manter à sombra da discussão.
Em Nova York, o
Departamento de Educação foi radical: publicou recentemente um guia de
orientação voltado aos professores e que os proíbe de se comunicar com alunos
em blog e redes sociais - vale para Facebook, Twitter, YouTube, Google+, Flickr
e qualquer outro similar. Segundo o Social Media Guidelines, caso a utilização
de um perfil online esteja ligada à realização de uma atividade pedagógica, é
preciso criar uma conta profissional. Ainda assim, não se deve adicionar
estudantes. O documento é apresentado como um guia que ajuda "funcionários
e estudantes a utilizar as mídias sociais de uma maneira segura e
responsável".
Por aqui, as escolas
adotam medidas diversas. Há quem se aproxime da visão americana. É o caso da
Escola Internacional de Alphaville, de Barueri, em São Paulo, cujos professores
também não devem manter contato com estudantes via redes sociais. "Pedimos
que eles não adicionem os alunos, até para evitar problemas caso alguém adicione
um professor e o docente, por descuido, não aceite. Pode acontecer
acidentalmente, e nós queremos evitar esses problemas", explica o
coordenador de tecnologia educacional da escola, Francisco Amâncio Cardoso
Mendes. Os funcionários também são orientados a não responder comentários nem
se envolver em discussões a respeito da escola - nesses casos, devem notificar
a instituição. A escola chegou a ter uma página no Facebook, mas a experiência
não deu certo. "Paramos de abastecê-la com conteúdo, porque nem todo mundo
na rede age de maneira ética. Há comentários maléficos, e não queremos
alimentar esse tipo de movimento. Nós preferimos ficar à margem das redes
sociais", diz Mendes. A utilização de Facebook, Twitter e similares é
vetada nas salas de aula.
Mas o colégio não ficou de
fora da discussão sobre redes. Desde o ano passado, tem promovido ações com o
objetivo de conscientizar alunos, pais e docentes sobre eventuais perigos da
internet. Depois de uma palestra sobre internet segura e capacitação dos funcionários
em 2011, neste ano, professores e alunos tiveram duas semanas voltadas à
discussão de questões relacionadas ao tema. "Primeiro, os temas foram
trabalhados em sala de aula, em todas as disciplinas. Queríamos instigá-los a
pensar sobre o que colocam na rede social, com quais objetivos e de que forma
isso acontece", explica o coordenador. Depois dos debates, foi ministrada
uma oficina para que os alunos apresentassem suas dúvidas e discutissem suas
inseguranças. "Trabalhamos para mostrar que a rede social é benéfica,
desde que o usuário tenha cuidado, saiba se prevenir e perceba que esse é um
espaço público, e não apenas dele", destaca. Mendes explica que a
iniciativa não surgiu de problemas causados pelas redes. "Acreditamos que
a conscientização é melhor que a correção, o que nos leva a agir
preventivamente, mostrar os perigos. Mostramos para os alunos o que aconteceria
em casos de cyberbullying, invasão de perfil ou vazamento de
informações em redes sociais", conta. A Escola Internacional de Alphaville
também investe no uso de tablets e aposta na utilização de aplicativos
educativos para realização de atividades pedagógicas.
Escola de Porto Alegre é a
primeira a criar cartilha de uso das redes
Problemas de privacidade e difamação são uma constante nas redes. Mas, para o
doutor em Ciências da Educação pela Universidade de Paris V Alex Sandro Gomes,
é papel da escola conscientizar crianças e jovens. "Essa geração tem muita
habilidade técnica, mas pouca habilidade social. Eles se expõem demais e lidam
muito mal com questões de privacidade. Se é papel da escola mostrar que o
cidadão deve dirigir com responsabilidade ou respeitar os mais velhos, o mesmo
vale na hora de alertar sobre a internet", compara. O especialista diz, no
entanto, que não é dever da escola punir caso o comportamento no ambiente
virtual seja inadequado. "Essa é uma questão de regulamentação. A partir dos
16 anos, alunos e professores podem responder civilmente por seus atos. Não
cabe à escola criar regras e normas. A legislação dá conta disso, caso o erro
seja grave. O papel da instituição de ensino não é regulamentar, e sim
conscientizar", afirma Gomes.
Pioneiro na criação de uma
cartilha do gênero, o Colégio Farroupilha, de Porto Alegre, no Rio Grande do
Sul, apresentou o Guia de Postura nas Redes Sociais à comunidade escolar no
início deste ano. Entre recomendações para evitar a publicação de conteúdos
ofensivos e difamatórios, além de verificar a veracidade de qualquer informação
antes de transmiti-la a outras pessoas, pais, professores e alunos foram
convidados a refletir sobre comportamento em ambientes virtuais. "Não
podemos nos isentar de orientar os alunos em relação à postura nos meios
virtuais", diz a psicóloga educacional do Farroupilha, Luciana Motta. A
instituição compreende, segundo a especialista, que a maior parte da interação
nas redes acontece fora do ambiente escolar, mas que ações além dos muros do
colégio podem refletir positiva e negativamente na convivência entre alunos,
professores e funcionários. "Entendemos que, nesse momento, precisamos nos
aliar às famílias. Todos os responsáveis receberam o guia, mesmo os de alunos
pequenos que ainda não conseguem ler. Esses pais também precisam estar
preparados", afirma.
A instituição tenta
equilibrar o uso das redes: os acessos normalmente são bloqueados, mas há
liberação para realização de tarefas de sala de aula - as ações, no entanto,
são integralmente monitoradas. Em parceria com o setor de tecnologia
educacional do Farroupilha, professores estimularam a criação de esquetes
teatrais sobre os riscos da rede e gerenciaram a criação de perfis online.
"Eles puderam ver o que é permitido colocar no Facebook, além de perceber
que tipo de ação acabaria os expondo. Uma questão atual que respinga no
ambiente escolar é o cyberbullyng, porque é muito mais fácil dizer coisas
quando não se está frente a frente. Nossos alunos aprenderam a ter uma postura
ética nas redes e respeitar os outros usuários", diz. O Farroupilha não
desestimula contatos virtuais entre professores e aluno. "A recomendação
que damos é de que tenham bom senso. Nossa preocupação é garantir que os papeis
fiquem bem definidos. Professor é professor, aluno é aluno, e é assim que deve
ser também nas redes sociais", afirma Luciana.
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